Em mensagem interceptada pelo Ministério Público do Rio, a ex-assessora parlamentar Márcia Oliveira de Aguiar, mulher de Fabrício Queiroz, reclamou das táticas impostas pelo advogado Frederick Wassef.
Em novembro do ano passado, ela disse à advogada Ana Flávia Rigamonti,
que trabalha com Wassef, que não queria mais viver como “marionete do
Anjo”. “Deixa a gente viver nossa vida. Qual o problema? Vão matar?”
As mensagens reforçam indícios de que,
embora negue, Wassef atuava de forma efetiva na proteção e abrigo de
Queiroz e familiares. Segundo as investigações, “Anjo” é o codinome de
Wassef, que defendeu o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) no processo que apura o esquema de “rachadinha” na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj). O advogado nega que o codinome seja uma referência a ele (leia mais abaixo).
Márcia está foragida desde o dia 18, quando
a Justiça do Rio determinou a prisão dela e de Queiroz. Ele foi detido
em uma casa de Atibaia (SP)
que funcionava como escritório de Wassef e enviado para o presídio
Bangu 8. O advogado deixou a defesa do senador após a prisão do
ex-assessor de Flávio.
Nas conversas obtidas pelo MP, Márcia
assume que poderia fugir caso tivesse a prisão decretada. “A gente não
pode mais viver sendo marionete do Anjo. ‘Ah, você tem que ficar aqui,
tem que trazer a família’. Esquece, cara. Deixa a gente viver nossa
vida. Qual o problema? Vão matar? Ninguém vai matar ninguém. Se fosse
pra matar, já tinham pego um filho meu aqui”, diz Márcia, em mensagem
enviada a Flávia no fim do ano passado. O MP teve acesso ao material em
dezembro, quando foram cumpridos mandados de busca em endereços ligados a
Queiroz e um celular da ex-assessora foi apreendido.
Os planos de Wassef, segundo os diálogos
apreendidos, incluíam alugar uma casa em São Paulo para abrigar toda a
família de Queiroz. Naquele momento, o Supremo Tribunal Federal (STF)
estava prestes a autorizar a retomada da investigação sobre as
rachadinhas (apropriação de parte dos salários dos servidores) no antigo
gabinete de Flávio, então paralisada devido à discussão sobre o uso de
informações do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf). As
conversas mostram que Márcia e Ana Flávia, que passou seis meses com
Queiroz em Atibaia enquanto trabalhava no escritório, achavam a ideia
ruim.
Com o passar dos dias, os áudios enviados
por Márcia à amiga eram cada vez maiores e mais frequentes. Em algum
deles, Márcia alternava choro com relatos sobre como a situação mexia
com sua saúde física e emocional. “Sei que também tá acabando com a
(saúde) dele (Queiroz)”. Em outra mensagem, a conversa revela que o
ex-assessor de Flávio também não concordava com os planos de Wassef.
Segundo a advogada, Queiroz disse isso ao
advogado, mas Wassef insistia no plano de esconder a família. “Ele
(Queiroz) não quer ficar mais aí, não”, diz Márcia, antes de ponderar:
“Ele (Anjo) vai fazer terror, né?” Quando Wassef passava uns dias em
Atibaia, Ana Flávia tomava cuidado ao falar com Márcia. A fim de evitar
que o chefe ouvisse a conversa, ela ia para o quintal.
Aos poucos, enquanto as duas demonstravam
incômodo com a situação, também começavam a questionar a eficácia da
estratégia do defensor. “O Anjo tem ideias boas, sim, mas na prática a
gente sabe que não é igual às mil maravilhas que ele fala”, comenta Ana
Flávia. A advogada diz que havia conversado até com a mulher de Wassef
na tentativa de frustrar a ideia de alugar uma casa para abrigar a
família Queiroz em São Paulo.
Márcia revela, nos áudios, achar que o
marido estava no “limite” e temia que o estado emocional dele
prejudicasse o tratamento do câncer. Segundo a ex-assessora, Queiroz
mantinha a compostura em Atibaia, mas, quando ia para o Rio, despejava
toda a carga sobre ela. “Chega a ser insuportável a convivência com
ele”, diz. “Estou vendo que ele está no limite dele”.
Casal
Essa preocupação levava Márcia a evitar se
lamentar na presença do marido. É notória a diferença entre as mensagens
enviadas ao companheiro e a Ana Flávia. Enquanto para a advogada
chegavam áudios e textos grandes, as conversas com o marido se limitavam
a informações pragmáticas ou, no máximo, comentários sucintos, como ao
dizer que achava “exagero” morar em São Paulo.
Os diálogos entre Márcia e Queiroz
costumavam se dar mais no campo da descontração. Ele enviava, por
exemplo, fotos de churrasco, pizza e o que mais estivesse comendo.
Márcia revela, nas mensagens trocadas com a amiga, se preocupar com a
alimentação do marido. Segundo ela, Queiroz não sabe fazer comida
saudável e se alimenta de “besteiras”.
Enquanto a defesa de Márcia e de Queiroz
afirma que não trabalha com a hipótese de delação premiada,
interlocutores da família sondaram escritórios de advocacia do Rio que
trabalham com o instrumento nos últimos dias. O Estadão apurou
que um advogado que já defendeu clientes famosos foi sondado, mas disse
que não trabalhava com delação. Outros escritórios foram procurados.
Procurada, Ana Flávia, que não é
investigada no caso, disse que não vai comentar. Também afirmou que não
tem nada a ver com o processo, já que apenas trabalhava no escritório de
Wassef. Flávio Bolsonaro não respondeu até a conclusão desta edição.
Wassef disse que não articulou qualquer
rotina de ocultação do paradeiro de Queiroz, e negou der dado ordens à
família. Ele ainda diz ser falso que o ex-assessor tenha passado período
de seis meses em seu imóvel em Atibaia. “O advogado diz ser vítima de
uma campanha de fake news e ilações irresponsáveis”.
Confira a resposta de Wassef ao ‘Estadão’ na íntegra:
Eu, Frederick Wassef, jamais
articulei qualquer rotina de ocultação do paradeiro de Fabrício Queiroz,
assim como nunca dei ordens a ele ou à sua família. Da mesma forma,
nunca o escondi.
Fabrício Queiroz não era procurado
ou foragido da justiça para ter que se esconder, e sequer existiam
intimações ou solicitações de comparecimento ao Poder Público do Rio de
Janeiro.
Nunca tive apelido de “anjo” com
quem quer que seja, da mesma forma nunca criei nenhum plano de esconder
Queiroz ou alugar casa para que sua família se mudasse. Não é verdade
que ele passou um período de 6 meses direto em Atibaia. Eu apenas
autorizei o uso da propriedade para quando Fabrício Queiroz entendesse
necessário.
Tenho sido vítima de uma campanha de
fake news e ilações irresponsáveis, enquanto apenas atuei no regular
exercício da advocacia, e minha única intenção era preservar uma vida
humana e garantir sua integralidade física, assim como evitar sua
execução no Rio de Janeiro quando autorizei o uso da propriedade.
Além disso, Queiroz foi submetido a 3
intervenções cirúrgicas ao mesmo tempo em que passava por seguidas
consultas e acompanhamento médico nas proximidades do imóvel, que serviu
para ele se visse livre de assédio e hostilidade.

Isso vai dar errado seu moço.
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