A procuradora de Justiça Soraya Taveira Gaya, do Ministério Público
do Rio, emitiu um parecer em 12 de maio deste ano pedindo o
restabelecimento da liminar que suspendeu a investigação sobre a
suspeita de “rachadinha”, a prática de devolução de salários de
assessores, no âmbito do antigo gabinete de Flávio Bolsonaro
(Republicanos-RJ) na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj). Gaya atua
por prerrogativa de função no habeas corpus junto à segunda instância do
Tribunal de Justiça do Rio e não faz parte do grupo de promotores do
Grupo de Atuação Especializada no Combate à Corrupção (Gaecc) que
investiga o senador e Fabrício Queiroz por peculato, lavagem de dinheiro
e organização criminosa.
O pedido ainda não foi apreciado na 3ª Câmara Criminal do TJ, e os
três desembargadores podem ou não acolher a manifestação da procuradora.
Gaya emitiu o parecer depois que a defesa de Flávio fez um pedido
semelhante em maio solicitando que o tribunal suspendesse as
investigações até a análise do mérito de um habeas corpus apresentado no
início de março ou então que o julgamento fosse, enfim, marcado. Neste
recurso, o senador questiona a competência do juiz Flávio Itabaiana, da
27ª Vara Criminal, para determinar quebra de sigilo bancário e fiscal,
além da busca e apreensão nas investigações. Na HC pedido pela advogada
Luciana Pires, a defesa sustenta que, como Flávio era deputado estadual
no período dos fatos investigados, o juízo competente seria o Órgão
Especial do TJ do Rio. Procurada, Luciana Pires disse que não se
pronunciará até o julgamento. Soraya Gaya não retornou.
Uma semana depois da apresentação do pedido da defesa, a relatora do
HC na 3ª Câmara, a desembargadora Suimei Cavalieri, decidiu em caráter
liminar suspender as investigações até que o plenário se manifestasse
sobre a questão da competência da 27ª Vara Criminal. Dias depois,
Cavalieri reconsiderou sua decisão e manteve o andamento das
investigações.
“A realidade é que inexiste lei em sentido formal ou material a
conferir ao Paciente (Flávio Bolsonaro) foro por prerrogativa de função
perante o Judiciário Fluminense, subsumindo o caso aos critérios de
definição de competência do Código de Processo Penal. Não há
interpretação razoável que permita forcejar a aplicação da exceção em
detrimento da regra, não há lacuna a ser colmatada nas normas legais e,
portanto, qualquer ilegalidade a ser sanada”, escreveu Cavalieri, ao
reconsiderar sua decisão anterior.
No parecer apresentado no dia 12 de maio, a procuradora Soraya,
valendo-se da independência funcional, argumentou a favor do
restabelecimento da primeira decisão liminar, que suspendeu o
procedimento onde atuam os promotores do Gaecc, ainda em março. Para
ela, a suspensão devia valer até que fosse marcado o julgamento e
afirmou que uma das alternativas viáveis seria que ele ocorresse de modo
virtual.
Desse modo, o caso foi pautado na terça-feira da semana passada. No
entanto, a procuradora Kátia Aguiar, que atua junto à 3ª Câmara, pediu
para fazer a sustentação oral contrária ao pedido da defesa de Flávio e
do parecer de Soraya Gaya, mas a tecnologia disponibilizada pelo
tribunal até o momento não permite que seja feita a sustentação à
distância. Desse modo, o caso saiu de pauta e o pedido de reconsideração
ainda não foi analisado.
Se a 3ª Câmara Criminal decidir que o caso deve ser julgado pelo
Órgão Especial, as decisões de quebra de sigilo bancário e fiscal de
Flávio Bolsonaro, Fabrício Queiroz e outras 100 pessoas podem ser
tornadas nulas. O mesmo pode ocorrer com as provas obtidas durante a
busca e apreensão nos endereços ligados a Queiroz e familiares de Ana
Cristina Siqueira Valle que constaram como assessores de Flávio.
Parecer anterior
A procuradora Soraya Gaya já tinha se manifestado a favor de que o
caso de Flávio fosse julgado no Órgão Especial do TJ em setembro do ano
passado, quando a defesa apresentou a questão pela primeira vez. No
primeiro parecer, ela escreveu que “existe uma tendência em extirpar o
chamado fórum privilegiado, que de privilégio não tem nada, trata-se
apenas de um respeito à posição ocupada pela pessoa. Assim, é muito mais
aparentemente justo, ser julgado por vários do que apenas por um, fica
mais democrático e transparente”, escreveu a procuradora.
No entanto, algum tempo depois, os advogados de Flávio desistiram do
recurso para aguardar a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a
legalidade dos relatórios do Conselho de Controle de Atividades
Financeiras (Coaf), que ocorreu em novembro passado. O STF manteve a
legalidade do compartilhamento de dados do Coaf e a defesa de Flávio
decidiu reapresentar ao TJ do Rio a questão da competência da 27ª Vara
Criminal este ano. Novamente a procuradora Soraya Gaya emitiu um parecer
contrário à competência de Itabaiana no caso, ainda em março.
Já, naquela época, a colunista Bela Megale revelou que no dia 20 de
março, a procuradora, Maria Aparecida Moreira de Araújo, tinha se
posicionado de forma contrária à análise de Gaya no habeas corpus.
"Papai cuida de você" seu moço.
O GLOBO
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