O guru Olavo de Carvalho pirou. Sem dinheiro, derrotado em vários
processos judiciais, vendo seu pupilo, o ministro da Educação Abraham
Weintraub com o cargo ameaçado e condenado agora a pagar uma indenização
por danos morais de R$ 2,8 milhões para o cantor Caetano Veloso, a quem
chamou insistentemente de pedófilo pelas redes nos últimos anos,
Carvalho perdeu as estribeiras em vídeos transmitidos pelo YouTube na
semana passada. Ele ameaçou derrubar o governo e acusou o presidente
Jair Bolsonaro, a quem chamou de “inativo” e “covarde”, de não fazer
nada para impedir crimes e agir contra bandidos.
Magoado, sentindo-se usado e perseguido, o guru renegou a amizade do
presidente e falou que não quer mais condecorações. “Enfia a
condecoração no cu”, afirmou, referindo-se à Grã Cruz, mais alto grau da
Ordem do Rio Branco, com a qual foi agraciado no início de maio. “Se
você não é capaz de me defender contra essa gente toda eu não quero a
sua amizade”, prosseguiu. Carvalho não foi específico, não disse quem é o
bandido e de quem quer ser defendido, mas deu sinais de que rompeu com
Bolsonaro e rompeu também com a razão. A não ser que surja a solução
para todos os seus males, uma providencial ajuda financeira para cobrir
suas dívidas milionárias, Carvalho deverá continuar enlouquecido contra o
governo. Mas, infelizmente, não parece provável que seja capaz de
derrubar Bolsonaro.
Seus impropérios, lançados desde sua casa, na Virgínia (EUA), causaram
surpresa entre seus simpatizantes e dispararam um festival de tolices
que só o atual governo e seus aliados poderiam oferecer. Mesmo xingado
pelo guru de “palhaço vestido de Zé Carioca”, por causa de seu terno
verde com gravata amarela, o empresário Luciano Hang, dono da rede de
lojas Havan, promoveu uma vaquinha entre amigos para ajudar o ideólogo
do governo a sair do buraco. “Temos que ajudá-lo financeiramente”,
proclamou num grupo de WhatsApp. “Ele está chateado, precisa de mais
ajuda para continuar lutando pelo Brasil”. Hang conversou com Bolsonaro
sobre o caso e os dois chegaram à conclusão de que é preciso dar um
socorro financeiro a Carvalho para que ele se acalme. Alguns amigos
empresários de Hang, porém, como Flávio Rocha, da Riachuelo, e Sebastião
Bonfim, da Centauro, demonstram resistência em abrir os bolsos para o
guru e se recusaram a participar da vaquinha.
Carvalho também está revoltado com a possibilidade de Abraham Weintraub
deixar o governo. Condecorado por Bolsonaro em maio com o grau de Grande
Oficial da Ordem de Mérito Naval, ele ficou com a corda no pescoço
desde que vieram a público suas ofensas contra os ministros do Supremo
Tribunal Federal (STF) na fatídica reunião ministerial do dia 22 de
abril. No Palácio do Planalto, depois de arrumar brigas e confusões e
abandonar a educação brasileira, Weintraub perdeu qualquer apoio e já
foi aconselhado a pedir demissão, como uma forma honrosa de largar o
cargo. Nos seus planos, está, inclusive, uma candidatura para a
Prefeitura de São Paulo. O ministro teria entrado em contato com o guru
para se lamentar e tentar reverter o quadro de ruptura que se avizinha.
Carvalho tomou suas dores e fez mais um ataque a Bolsonaro. “Porque eu
fui seu amigo, mas você nunca foi meu amigo (…) Você só tira proveito. E
devolve o quê? É que nem o Weintraub. Dá uma condecoração. Tá brincando
com isso, porra. Só essas multas que os caras tão cobrando de mim, é
pra me arruinar totalmente. Como é que eu vou sobreviver nos EUA sem um
tostão furado”, protestou. Um provável nome para assumir a Educação é o
do empresário Carlos Wizard, que desistiu recentemente de um cargo no
Ministério da Saúde. Sobre seus problemas, Weintraub usou o Twitter para
filosofar. “Estou contrariado, mas não derrotado, eu sou bem guiado
pelas Mãos Divinas!”, disse.
O processo de Caetano Veloso contra Olavo de Carvalho já transitou em
julgado e não oferece mais possibilidade de recurso. Caetano é uma
obsessão antiga do guru, que ajudou a promover a hashtag
#caetanopedofilo. A condenação pelos danos morais foi de R$ 40 mil, que
chegaram, corrigidos, a R$ 54 mil. Tratou-se de uma ação de obrigação de
fazer com pedido de tutela de urgência cumulada com indenização por
danos morais, aberta em 2017. O pedido de tutela foi feito com o
objetivo de obrigar Carvalho a retirar todas as postagens ofensivas
contra Caetano e parasse de atacar o artista, sob pena de multa diária
de R$ 10 mil. Olavo retirou algumas postagens, mas não todas, e por isso
o valor da indenização começou a crescer, chegando agora a R$ 2,8
milhões. “A ideia é penhorar as coisas dele”, disse a empresária Paula
Lavigne, mulher de Caetano.
Bullying virtual
“E se não conseguirmos fazer isso no Brasil, iremos cobrá-los nos
Estados Unidos”. Segundo Paula, há um roteiro programado de ataque à
classe artística no País e Olavo de Carvalho passou de todos os limites.
Ela se diz satisfeita com o resultado da ação a adianta que o dinheiro
do guru “será usado em causas que pautem nossa resistência”. “Nem todo
mundo tem como se defender de ataques e linchamentos morais pela
internet. A ação do Caetano tem uma função pedagógica e mostra que quem
ofender os outros e praticar bullying virtual pode sofrer consequências
gravíssimas”, disse a advogada Simone Kamnetz, que defende Caetano. “As
pessoas tem que aprender que elas não podem fazer o que quiserem pela
internet”. A defesa de Carvalho reiterou durante o processo que ele não
mentiu quando chamou Caetano de pedófilo.
Eminência parda do governo, com influência direta sobre os filhos 02 e
03 de Bolsonaro, Carlos e Eduardo, Carvalho também reclama da imprensa,
que diz atacá-lo sem piedade. “Nunca houve contra um cidadão particular
um massacre jornalístico e judiciário desse tamanho, nem contra
narcotraficantes e líderes revolucionários”, disse Olavo, referindo-se a
si próprio. “Há décadas existe esse gabinete do ódio contra Olavo,
porra!” Carlos e Eduardo deflagraram, inclusive, com apoio de blogs
bolsonaristas, uma operação para segurar Weintraub, diante dos lamentos
do guru. Atualmente, Carvalho está desprestigiado entre os ministros do
governo. Resta-lhe a simpatia apenas do ministro da Educação e do
ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo. Apesar de estar no fim
da linha, Weintraub quer cair atirando. Em mais um ato arbitrário,
Bolsonaro publicou uma Medida Provisória (MP), na quarta-feira 10, que
permite ao ministro escolher reitores temporários das universidades
federais durante o período de pandemia. O texto acaba com a necessidade
de consulta a professores e alunos ou de uma lista para escolha dos
reitores.
Na nau dos insensatos em que se converteu o governo Bolsonaro não se
salva ninguém. Com a influência de Olavo, que considera a pandemia de
coronavírus uma ficção, ministros criticam o isolamento e invertem a
lógica da saúde. Transformam uma medida benéfica em algo ruim. “Idosos
estão sendo algemados e jogados dentro de camburões no Brasil. Mulheres
sendo jogadas no chão e sendo algemadas por terem feito nada”, disse a
ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, Damares Alves. “A maior
violação de direitos humanos da história do Brasil nos últimos trinta
anos está acontecendo neste momento, mas nós estamos tomando
providências”. Uma das providências, possivelmente, será pagar as
dívidas de Olavo de Carvalho porque a furia do guru tumultuou o governo.
Ele terá essa força seu moço?
IstoÉ
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