O juiz Bruno Montenegro Ribeiro Dantas, integrante do Grupo de Apoio às Metas do CNJ, proferiu sentença referente à primeira fase da Operação Sinal Fechado, deflagrada pelo Ministério Público Estadual em 2011
para apurar suspeitas de fraude e corrupção no âmbito do Departamento
Estadual de Trânsito do Rio Grande do Norte (Detran/RN) entre os anos de
2008 e 2011.
Seis pessoas foram condenadas nesta fase, pela prática de crimes como peculato, corrupção e associação criminosa: George
Olímpio, Lauro Maia,Marcus Vinícius Furtado da Cunha, Marcus Vinícius
Saldanha Procópio, Jean Queiroz de Brito, e Luiz Cláudio Morais Correia
Viana.
Com 320 páginas, a sentença,cuja Ação Penal tramita na 9ª Vara
Criminal de Natal, tem como foco a celebração de convênio entre o Detran
e o Instituto de Registradores de Títulos e Documentos de Pessoas
Jurídicas do Rio Grande do Norte (IRTDPJ/RN), o que, segundo os autos,
resultou na oneração do cidadão potiguar, pois o Detran passou a exigir o
registro, em cartório, dos contratos de financiamento de veículos com
cláusulas de garantia real.
A sentença destaca que a operação Sinal Fechado apura a atuação de
uma organização criminosa constituída para a prática de delitos no
âmbito do Detran, cujos objetivos criminosos teriam sido alcançados
através do pagamento e da promessa de propina a servidores públicos,
fraude a licitações, tráfico de influências, além da utilização de
instrumentos de intimidação e chantagem a ocupantes de cargos públicos
no Estado do Rio Grande do Norte para tentar manter contratos obtidos
ilicitamente, os quais ensejaram a prática de desvio de recursos
públicos e particulares em favor da quadrilha.
Em relação aos resultados do convênio, “ficou assentado nos autos que
milhares de pessoas – das mais diversas e variadas classes sociais,
muitas delas não abastadas, sem dúvidas -,as quais registravam seus
contratos de financiamento de veículos, foram indevidamente cobradas por
serviços viciados, mediante a atuação da associação criminosa. Os
delitos atingiram indiscriminadamente diversos órgãos públicos e a
sociedade como um todo”, destaca o juiz Bruno Montenegro na sentença.
O magistrado considera ainda que os delitos ostentam expressividade
financeira e que os lucros auferidos comas práticas criminosas foram
vultuosos. “A amplitude dos valores drenados da máquina pública para a
esfera patrimonial da parte ré, ainda que considerada deforma
pulverizada, representa o agigantamento descomunal do esquema
criminoso,o qual multiplicava os valores em razão do número de contratos
de financiamento registrados mensalmente, operação matemática que levou
à soma ao patamar dos milhões de reais”.
Condenações
O juiz Bruno Montenegro não atendeu ao
pedido de perdão judicial formulado pelo Ministério Público Estadual a
George Anderson Olímpio da Silveira em razão de sua colaboração
premiada, firmada em 2017. Considerou ser mais apropriado a concessão de
diminuição da pena em sua fração máxima, de dois terços. O magistrado
destacou que George Olímpio é o líder da organização criminosa,
“protagonista e responsável pela movimentação, pela instigação e pela
motivação de seus comparsas em prol da empreitada criminosa” e o
condenou pelos crimes de associação criminosa, peculato e corrupção
ativa a uma pena final de cinco anos e onze meses de reclusão, em regime
inicialmente fechado.
“Restou evidenciada a habilidade do réu em cooptar e manipular
pessoas para perfectibilizar o atendimento de seus interesses, tendo,
ele, manuseado os mais variados artifícios: relações familiares,
amizades, cobrança de favores, desempenho indevido da advocacia,suborno,
inverdades, ameaças, além de outros expedientes ardilosos. Em linhas
gerais, o seu desempenho destacado e consciente nas ações criminosas
influenciou a dinâmica organizacional do Estado, tanto no que toca aos
atos administrativos, quanto na própria seara política. Além do mais, o
acusado manipulou, de modo engenhoso, grande parte do empresariado
potiguar, para que fossem financiados campanhas e planejamentos,
mantendo elos de conexão com figuras políticas tradicionais do Estado do
Rio Grande do Norte”, diz a sentença.
O juiz Bruno Montenegro condenou Lauro Maia pela prática dos crimes
de associação criminosa, peculato e corrupção passiva, à pena total de
22 anos seis meses de reclusão, em regime inicialmente fechado. O
magistrado destacou que o filho da ex-governadora Wilma de Faria exerceu
papel fundamental no esquema criminoso e “manejava, como força motriz
de sua esfera de influência, os laços de filiação com a ex-governadora
Wilma de Faria, a qual não precisava ir à luz do dia no decorrer das
negociações escusas, justamente pela atuação do seu filho, ora réu,
rotulado como ‘Testa de Ferro’ daquela ex-mandatária. Não raras vezes, o
acusado Lauro Maia expedia ordens informais, de modo oficioso e em nome
da ex-governadora, aproveitando-se da verticalidade constatada entre o
Governo do Estado e o DETRAN-RN para viabilizar, ao seu livre talante, o
esquema fraudulento”.
Marcus Vinícius Saldanha Procópio foi condenado pelos crimes de
associação criminosa e peculato à pena total de 14 anos de reclusão, em
regime inicialmente fechado. “Ficou evidente que o réu ostentava
vínculos familiares com João Faustino e sua participação envolvia tanto o
viés operacional das bases da INSPAR, no caso técnico, quanto as
negociações escusas – ou pouco republicanas – na fraude relativa aos
Consórcios. Embora sustente que sua remuneração originava-se,
exclusivamente, da construção e da supervisão das bases, existem relatos
de George Olímpio mencionando o pagamento de propina a João Faustino, o
qual também beneficiaria Marcus Procópio”.
O juiz destaca ainda que“Marcus Procópio concorreu para a corrupção
passiva, uma vez que recebia os valores desviados em nome de outrem –
leia-se, de João Faustino – , tendo em vista a função de suplente de
Senador Federal ocupada por este, em recompensa à chamada assessoria
parlamentar”.
À época procurador geral do Detran/RN, Marcus Vinícius Furtado da
Cunha foi condenado pelos crimes de associação criminosa, peculato e
corrupção passiva. Em razão de sua delação premiada, teve sua pena
reduzida em um terço, chegando-se a uma pena total de 11 anos e dez
meses de reclusão em regime inicialmente fechado. “Não é exagerado
acentuar que o acusado operou como peça fundamental, ou seja, como elo
de ligação entre os parceiros privados do Instituto e das Empresas DJLG e
MBMO e o corpo de serviço público da autarquia. Ele formou, ao lado de
George Olímpio, uma engrenagem básica que articulava interesses e
promovia atos administrativos capazes de nutrir os anseios da
Organização Criminosa. O acusado agiu como mentor jurídico das fraudes
perpetradas através do Detran/RN”.
Jean Queiroz de Brito foi condenado pelos crimes de associação
criminosa e de peculato, à pena definitiva de 11 anos e oito meses de
reclusão, em regime inicialmente fechado. “Os autos
revelam que ao sentenciado cabia 30% dos lucros. (…) Ficou esclarecido
que Jean Queiroz de Brito compôs as primeiras tratativas para a
concatenação do esquema criminoso, sobretudo por ser parte da família
dos acusados Marluce e George, tendo sido alocado no esquema para lucrar
com os repasses fraudulentos do IRDTPJ para as empresas DJLG e MBMO,
supostamente legais”.
Luiz Cláudio Morais Correia Viana foi condenado pelos crimes de
associação criminosa e de peculato, à pena definitiva de 11 anos e oito
meses de reclusão, em regime inicialmente fechado. “Os autos revelam que
ao sentenciado Luiz Cláudio Morais Correia Viana cabia 30% dos lucros,
em que pese não detivesse, este, o poder de mando e de articulação na
rotina dos outros acusados”.
Segundo a sentença, ele foi um dos idealizadores dos desvios de
recursos por intermédio das atividades cartorárias, transferindo o
know-how criminoso para George Olímpio e Marluce Freire, os quais
assimilaram o estratagema ilícito, contando com outros associados locais
para proceder com o fomento e o desenrolar da fraude.
“O réu, a despeito do exercício de suas funções notariais
desempenhadas na cidade de Fortaleza, idealizou e se inseriu em um
esquema criminoso, em prejuízo da sociedade norte riograndense, buscando
expandir os limites de seus projetos criminosos para além das
fronteiras cearenses”, observa o juiz Bruno Montenegro.
Extinção depunibilidade
Em razão de suas mortes, o juiz Bruno Montenegro reconheceu a
extinção de punibilidade em relação à ex-governadora Wilma de Faria, ao
ex-governador Iberê Ferreira de Souza, ao ex-senador João Faustino e à
Marluce Olímpio Freire, tia de George Olímpio e presidente do IRTDPJ/RN.
Absolvição
Então diretor geral do Detran/RN, Carlos Theodorico de Carvalho
Bezerra foi absolvido dos crimes a ele imputados. Para o juiz Bruno
Montenegro, os elementos de prova levados ao processo não são capazes de
caracterizar, sem dúvida razoável, a autoria e o dolo do acusado quanto
aos delitos que lhe foram imputados.
“As provas carreadas descortinam, senão,que o réu Carlos Theodorico
se mostrava, no mais das vezes, recalcitrante e reticente, inclusive se
negando a praticar diversos atos referentes à celebração do convênio
entre o Instituto e o Detran-RN. Devo levar em consideração, também, os
reiterados depoimentos das testemunhas, uníssonos ao definir o
comportamento profissional e rotineiro do acusado, o qual frequentemente
realizava consultas aos especialistas de cada setor do Detran, e
geralmente chancelava tais pareceres, compartilhando as decisões tomadas
com outras autoridades da autarquia”.
O juiz ressalta que “subsistem dúvidas contundentes quanto à autoria e
quanto ao dolo do agente, pois não ficou claro, pelo menos a este
magistrado, se o acusado efetivamente se apropriou de valores ilícitos,
se desviou quantias ou se solicitou ou recebeu vantagem indevida, no
exercício de suas funções”.
(Ação Penal nº 0100505-02.2016.8.20.0003)
Secretaria de Comunicação Social do Tribunal de Justiça do RN
Sinal fechado...
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