A Polícia Federal identificou o vereador Carlos Bolsonaro, filho do
presidente Jair Bolsonaro, como um dos articuladores do esquema
criminoso de fake news, segundo investigação sigilosa conduzida pelo STF
(Supremo Tribunal Federal).
Nos últimos meses, o presidente cobrou informações sobre as
investigações, em reuniões e por telefone, de Maurício Valeixo, demitido
da diretoria-geral da PF na última sexta (23). Segundo a Folha apurou,
Valeixo resistiu ao assédio de Bolsonaro.
Um dos quatro delegados que atuam no inquérito é Igor Romário de
Paula, que coordenou a Lava Jato em Curitiba quando Sergio Moro, agora
ex-ministro da Justiça, era o juiz da operação. Valeixo foi
superintendente da PF no Paraná no mesmo período e escalado por Moro
para o comando da PF.
Dentro da Polícia Federal, não há dúvidas de que Bolsonaro pressionou
Valeixo, homem de confiança de Moro, porque tinha ciência de que a
corporação havia chegado ao seu filho, chamado por ele de 02 e vereador
do Rio de Janeiro pelo partido Republicanos.
Para o presidente, tirar Valeixo da direção da PF poderia abrir
caminho para obter informações da investigação do Supremo ou inclusive
trocar o grupo de delegados responsáveis pelo caso.
Não à toa, na sexta-feira (24), logo após Moro anunciar publicamente
sua demissão do Ministério da Justiça, o ministro Alexandre de Moraes,
relator do inquérito no Supremo, determinou que a PF mantenha os
delegados no caso.
O inquérito foi aberto em março do ano passado pelo presidente do
STF, Dias Toffoli, para apurar o uso de notícias falsas para ameaçar e
caluniar ministros do tribunal.
Carlos é investigado sob a suspeita de ser um dos líderes de grupo
que monta notícias falsas e age para intimidar e ameaçar autoridades
públicas na internet. A PF também investiga a participação de seu irmão
Eduardo Bolsonaro, deputado federal pelo PSL de SP.
Procurado por escrito e por telefone, o chefe de gabinete de Carlos não respondeu aos contatos da reportagem.
Para o lugar de Valeixo, no comando da PF, Bolsonaro escolheu
Alexandre Ramagem, hoje diretor-geral da Abin (Agência Brasileira de
Inteligência). Ramagem é amigo de Carlos Bolsonaro, exatamente um dos
alvos do inquérito da PF que tramita no STF.
Os dois se aproximaram durante a campanha eleitoral de 2018, quando
Ramagem atuou no comando da segurança do então candidato presidencial
Bolsonaro após a facada que ele sofreu em Juiz de Fora (MG).
Carlos foi quem convenceu o pai a indicá-lo para o lugar de Valeixo.
Os dois ficaram ainda mais próximos quando Ramagem teve cargo de
assessor especial no Planalto nos primeiros meses de governo. Carlos é
apontado como o mentor do chamado “gabinete do ódio”, instalado no
Planalto para detratar adversários políticos.
Segundo aliados de Moro, ao mesmo tempo que a PF avançava sobre o
inquérito das fake news, Bolsonaro aumentava a pressão para trocar
Valeixo.
Bolsonaro enviou mensagem no início da manhã de quinta-feira (23) a
Moro com um link do site Antagonista com uma notícia sobre o inquérito
das fake news intitulada “PF na cola de 10 a 12 deputados
bolsonaristas”.
“Mais um motivo para a troca”, disse o presidente a Moro se referindo à sua intenção de tirar Valeixo.
Moro respondeu a Bolsonaro argumentando que a investigação, além de
não ter sido pedida por Valeixo, era conduzida por Moraes, do STF.
O mesmo grupo de delegados do inquérito das fake news comanda a
investigação aberta na terça-feira (22), também por Moraes, para apurar
os protestos pró-golpe militar realizados no domingo passado e que
contaram, em Brasília, com a participação de Bolsonaro.
Assim como no caso das fake news, o ministro do STF determinou que os
delegados não podem ser substituídos. O gesto é uma forma de blindar as
apurações dos interesses pessoais e familiares do presidente da
República.
Há uma expectativa dentro do Supremo de que os dois inquéritos, das
fake news e dos protestos, se cruzem em algum momento. Há suspeita de
que empresários que financiaram esse esquema de notícias falsas também
estejam envolvidos no patrocínio das manifestações.
Coincidentemente, Bolsonaro apertou o cerco a Valeixo após a abertura dessa nova investigação.
Dentro do STF, pessoas próximas a Moraes avaliam que ele deve
encerrar logo a investigação das fake news para se dedicar à dos
protestos.
O inquérito foi aberto a pedido do procurador-geral, Augusto Aras, e
envolveria pelo menos dois deputados apoiadores de Bolsonaro.
O objetivo de Aras é apurar possível violação da Lei de Segurança
Nacional por “atos contra o regime da democracia brasileira por vários
cidadãos, inclusive deputados federais, o que justifica a competência do
STF”.
Interlocutores do procurador-geral afirmam que, inicialmente,
Bolsonaro não será investigado. Alertam, porém, que, caso sejam
encontrados indícios de que o chefe do Executivo ajudou a organizar as
manifestações, ele pode vir a ser alvo do inquérito.
Em sua decisão, Moraes cita a Constituição e salienta que o ato, como
descrito pelo PGR, “revela-se gravíssimo, pois atentatório ao Estado
Democrático de Direito brasileiro e suas Instituições republicanas”.
Nossa...
FolhaPress
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