Uma decisão liminar da 5ª Vara da
Justiça Federal no Rio Grande do Norte, emitida na sexta-feira (24), determinou
a retirada do ar da "ordem do dia alusiva ao 31 de março de 1964" do
site do Ministério da Defesa. O documento, assinado pelo ministro da Defesa,
Fernando Azevedo e Silva, e pelos comandantes das Forças Armadas, exalta o
golpe de Estado de 1964 como um "marco para a democracia brasileira".
O Ministério Público Federal (MPF) já havia emitido parecer a favor da exclusão
do conteúdo, entendimento seguido pela decisão judicial. A ação pede ainda que
o governo federal se abstenha de divulgar qualquer conteúdo em comemoração à
data.
A retirada da nota é objeto de ação
popular proposta pela deputada federal Natália Bonavides (PT), do Rio Grande do
Norte. Foi concedido um prazo de cinco dias para o cumprimento da decisão. Até
as 16h deste sábado (25) a nota se encontrava no site do Ministério da Defesa (print abaixo).
A decisão liminar é de autoria da
juíza federal Moniky Mayara Costa Fonseca e aponta que "a ordem do dia
prega, na realidade, uma exaltação ao movimento, com tom defensivo e cunho
celebrativo à ruptura política deflagrada pelas Forças Armadas em tal período,
enaltecendo a instauração de uma suposta democracia no país, o que, para além
de possuir viés marcantemente político em um país profundamente polarizado,
contraria os estudos e evidências históricas do período".
A juíza também frisou que "o ato
administrativo impugnado é nitidamente incompatível com os valores democráticos
insertos na Constituição Federal de 1988" e que "a utilização de um
portal eletrônico oficial de um órgão do Executivo federal para enaltecer o
golpe de 1964 desvia-se das finalidades inscritas no atual texto
constitucional".
O procurador da República Camões
Boaventura destacou que "toda e qualquer iniciativa estatal de celebrar o
regime ditatorial, minimizar a gravidade do período ou reescrever a história,
além de contrariar o texto constitucional e o sistema protetivo internacional
de direitos humanos, é contraditória com reconhecimentos e confissões
anteriores do Estado brasileiro. Trata-se de uma reiteração de graves lesões às
vítimas diretas do regime, a elas impondo novos sofrimentos".
No parecer, Camões Boaventura
destacou que o texto no site do Ministério da Defesa não é um ato isolado, mas
representa a escalada de práticas estatais autoritárias observadas no país, que
demandam 'uma atuação rápida e enérgica do Poder Judiciário'. Em 2019, a
Justiça Federal proibiu comemorações dos 55 anos da tomada de poder pelos
militares, que haviam sido determinadas pela Presidência da República. De
acordo com o procurador, a 'ordem do dia' promove reiteração da prática abusiva
e é necessário que a proibição não se atenha ao ano de 2020, mas seja
permanente, para "expurgar de vez do imaginário estatal nacional
celebrações desse viés".
Na ação, a União se defendeu ao
apontar que "a Ordem do Dia consiste em ato rotineiro da caserna, despido
de caráter comemorativo ou celebrativo. Limita-se, pois, aos ambientes
militares e, em regra, busca informar sobre os aspectos históricos de
determinados acontecimentos sociais" e "que evento similar foi
repetido em anos anteriores no âmbito dos Comandos da Forças Armadas, sem que
nenhuma publicidade tenha sido dada a ocasião".
Em outro trecho, diz que a
"Ordem do Dia é a manifestação superior direcionada aos militares, que em
princípio devem ser lidas na respectiva data, em formatura diária em cada
Organização Militar ou, de acordo com a existência de previsão de solenidade
específica".
Em nota enviada ao G1, o Ministério da Defesa "entende que a decisão
judicial diverge de outras decisões judiciais, proferidas em anos anteriores,
sobre o mesmo assunto". Diz ainda que "após ser devidamente
notificado, irá recorrer ao tribunal competente para pleitear a suspensão e a
reforma da referida decisão".
"O MD esclarece que as notas
oficiais e as Ordens do Dia, referentes à data histórica de 31 de março de
1964, são expedidas e publicadas todos os anos, não sendo nenhuma novidade em
2020. Em nenhuma ocasião, tal tradição militar foi considerada ilegal ou
contrária ao regime democrático por qualquer Tribunal Judiciário", conclui
a nota.
Recado dado...
G1
Registe-se aqui com seu e-mail
ConversãoConversão EmoticonEmoticon