Candidato, Jair Bolsonaro era um ardoroso defensor da regra que
permite a prisão de condenados em segunda instância. Presidente, o
capitão silencia sobre o tema. Delega à Advocacia-Geral da União a
tarefa de defender a tese. Às vésperas do início do julgamento em que o
Supremo Tribunal Federal pode rever a norma, o presidente recebeu em
audiência três togas: Dias Toffoli, Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes.
O teor das conversas não foi revelado.
O apreço retórico de Bolsonaro pelo encarceramento de corruptos era
tão grande que ele fez, no final de 2017, uma exigência inusual para um
dos partidos com os quais negociava sua filiação. Chamava-se Partido
Ecológico Nacional. Além de reivindicar a troca do nome da legenda para
Patriota, o então candidato cobrou a desistência de um pedido de liminar
que o partido fizera no Supremo em favor da abertura das celas dos
condenados em duas instâncias.
Bolsonaro acabou optando pelo PSL. Mas o PEN cumpriu suas exigências.
Passou a se chamar Patriota. E desistiu do pedido de liminar,
destituindo o advogado Antonio Carlos de Almeida Castro, o Kakay.
Presidente do partido, Adilson Barroso procurou Kakay na época para
informar que Bolsonaro condicionara sua entrada na legenda à desistência
da ação sobre prisão. Foi alertado de que não poderia mais abrir mão da
ação.
Kakay relembra o episódio: “Por razões políticas deixei de
representar o PEN quando o então candidato e hoje presidente decidiu se
filiar ao PEN e exigiu a desistência da Ação e a minha destituição. Mal
sabia que a ADC [Ação Direta de Constitucionalidade] é uma ação
indisponível e não seria possível a desistência. Para meu gáudio fui
destituído a pedido do então candidato. Uma honra ter sido destituído
por defender a presunção de inocência.”
O advogado fará sustentação oral no Supremo em nome do Instituto de
Garantias Penais. Falará da tribuna como amicus curie, expressão latina
que significa “amigo da corte”.
Pelo menos dois dos ministros recebidos por Bolsonaro nesta
quarta-feira —Toffoli e Gilmar— são contrários à prisão de condenados em
duas instâncias. Antes, o capitão torcia o nariz para ambos. Mas
descobriu recentemente que Toffoli e Gilmar são amigos de infância que
ele conheceu depois dos 60 anos. A revelação da amizade tardia veio
junto com duas liminares que os ministros expediram para trancar o
processo do primogênito Flávio Bolsonaro por peculato e lavagem de
dinheiro.
Pense numa fraude foi esse candidato viu seu moço.
JOSIAS DE SOUZA
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