O jornal Folha de São Paulo, em parceria com o site The Intercept, divulgou
nesta 2ª feira (16.set.2019) mais uma conversa de integrantes da
força-tarefa da Lava Jato, no caso que ficou conhecido como Vaza Jato.
Segundo a reportagem, o empresário Léo Pinheiro, ex-presidente da OAS,
ao negociar acordo de delação, mencionou que o ex-presidente Lula teria
intermediado negócios da empresa com governos na Costa Rica e no Chile.
O relato da proposta de delação de Léo Pinheiro que, segundo o
jornal, foi compartilhada por procuradores da Lava Jato no aplicativo
Telegram apontam que Pinheiro afirmou também que a construtora assumiu
uma obra na Bolívia para agradar ao petista. De acordo com ele, Lula
queria evitar 1 desgaste nas relações do Brasil com o governo de Evo
Morales.
A obra mencionada é a construção de uma estrada entre as
cidades de Potosí e Tarija. A construção havia sido iniciada pela
Queiroz Galvão em 2003, porém, o contrato foi rompido em 2007 porque o
conglomerado se envolveu em 1 embate com o governo de Evo, que cobrava a
reparação de fissuras em pistas recém-construídas.
Segundo reportado pela Folha de São Paulo,
o empreiteiro relatou que Lula articulou 1 financiamento do Banco
Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) na Bolívia e
prometeu à OAS a obtenção de 1 outro contrato no país como forma de
compensação por tocar 1 projeto.
De acordo com as mensagens, Léo Pinheiro disse que o governo brasileiro afirmou que o impasse proporcionava “riscos diplomáticos” ao país. A paralisação da construção da estrada começou a criar protestos nas regiões afetadas.
Pinheiro
teria afirmado ao então presidente Lula que a obra seria deficitária,
diante dos trechos que precisariam ser consertados e dos preços
previstos. A resposta teria sido a de que Evo estaria disposto “a compensar economicamente a empresa, adjudicando 1 outro contrato em favor da OAS”.
A
reportagem alega que foi dito em depoimento que a Bolívia retirou
sanções impostas à Queiroz Galvão, autorizou a transferência do contrato
e licitou 1 outro trecho no qual a OAS se saiu vencedora. Após a
empresa assumir a obra em 2009, Pinheiro contou que a situação desandou
mais adiante, já no governo Dilma Rousseff (PT), quando a área técnica
do BNDES pôs entraves ao financiamento.
O contrato da OAS acabou
cancelado pela Bolívia e, de acordo com as mensagens sobre o depoimento,
à empresa só restou negociar para retirar seus equipamentos e obter uma
devolução de garantias, “após apelos de Lula”.
O custo
total da construção da estrada, de 340 km, foi estimado pela Bolívia na
década passada em US$ 226 milhões (atualmente, em torno de R$ 925
milhões).
O acordo de delação
A delação de Léo Pinheiro
foi fechada com a Procuradoria Geral da República e homologada neste mês
pelo STF (Supremo Tribunal Federal). Ele está preso desde 2016 e foi o
principal acusador de Lula no caso do tríplex de Guarujá (SP), pelo qual
o petista foi condenado e cumpre pena em Curitiba desde abril do ano
passado.
O depoimento em questão faz parte de uma proposta de
delação em junho de 2017. Nesse documento, o ex-presidente da OAS também
menciona Lula ao falar de palestras contratadas pela empresa na Costa
Rica e no Chile para “influenciar em negócios da empresa”.
Segundo
o relato, Lula foi contratado pela empreiteira em 2011, por US$ 200
mil, para uma conferência, e intermediou 1 encontro de Léo Pinheiro com
Óscar Arias, ex-presidente costa-riquenho e prêmio Nobel da Paz de 1987.
Também
relatou reunião com a então presidente Laura Chinchilla, na qual Lula
teria apresentado a empresa para que atuasse em concessões públicas. O
negócio, contou Pinheiro, foi concretizado.
Segundo Léo Pinheiro,
em 2013, a OAS temia perder o contrato de um um consórcio para a
construção de uma ponte no sul do Chile com a mudança de governo, no ano
seguinte, e a situação foi explicada a Lula na ocasião de viagem para
uma palestra. Michelle Bachelet, do Partido Socialista, tomaria posse em
março de 2014.
Lula teria dito que conversou com o ex-presidente
chileno Ricardo Lagos, também do Partido Socialista, que teria garantido
que a construtora brasileira continuaria na obra.
O empreiteiro
disse ainda que, na sequência, Lula pediu dinheiro da OAS para a
campanha de Bachelet. Pinheiro disse ter determinado, então, o pagamento
de 101,6 milhões de pesos chilenos, o equivalente à época a cerca de R$
400 mil reais, “nos interesses da campanha de Bachelet”.
Segundo
as mensagens, esse valor foi pago por meio de contrato fictício firmado
com a empresa Martelli y Associados, já depois de encerrada a campanha.
Em
2017, a OAS foi alvo de mandados de busca em investigação no Chile.
Bachelet, após a divulgação de reportagens sobre supostos elos com a
OAS, negou irregularidades em sua campanha e disse que todo o
financiamento foi regular.
Um outro país citado nos depoimentos é a
Guiné Equatorial, na África. Pinheiro afirma que Lula defendeu em 2012,
em reunião com o ditador de Guiné Equatorial, Teodoro Obiang, a
contratação da OAS para um projeto no país africano, que acabou ficando
com a construtora brasileira.
Com a homologação do acordo, caberá
ao Ministério Público e à Justiça decidir se há algum indício de
irregularidade nos episódios relatados que exija a abertura de
investigações.
O outro lado
Procurada pela Folha de São Paulo, a defesa de Lula disse por meio de nota que “a mentira negociada é a estratégia da Lava Jato para promover uma perseguição política contra o ex-presidente”. Ela também afirma que o petista jamais solicitou ou recebeu qualquer vantagem indevida.
“Diálogos
já revelados pela própria Folha envolvendo procuradores da Lava Jato
mostram que Léo Pinheiro foi preso porque não havia apresentado uma
versão incriminatória contra Lula. Da prisão, o empresário fabricou uma
versão contra Lula para obter os benefícios que lhe foram prometidos,
alterando o comportamento por ele adotado durante a fase de
investigação”, diz a nota do advogado Cristiano Zanin.
“A
versão de Léo Pinheiro é desmentida por manifestação apresentada em
07/02/2017 pela empresa do próprio executivo —a OAS— no processo,
afirmando que ‘não foram localizadas contratações ou doações para
ex-presidentes da República, tampouco para institutos ou fundações a
eles relacionadas’.”
O embaixador da Bolívia no Brasil, José Kinn, afirmou ao jornal que não conhece as declarações de Léo Pinheiro.
Sobre a obra assumida pela empreiteira, disse que a Queiroz Galvão se recusou a reparar 92 km de estrada que estavam “com sérios defeitos” e que a empreiteira brasileira pediu permissão para transferir o contrato à OAS.
Segundo ele, “a OAS declarou que estava fazendo 1 sacrifício” e pediu que a Bolívia oferecesse outra obra, o que foi negado.“Em nenhum momento nos comprometemos a ‘compensar’ com outro trabalho”, afirmou o embaixador.
A defesa de Léo Pinheiro não quis comentar.
A atual direção da OAS tem dito que os relatos feitos por ex-executivos “não competem mais” à companhia e que está colaborando com a Justiça.
A Folha procurou a fundação de Ricardo Lagos para comentar o assunto, mas não obteve resposta.
Michelle Bachelet sempre negou irregularidades em relação ao financiamento de sua campanha.
Sobre a Vaza Jato
As mensagens entre procuradores e membros da força-tarefa da Lava Jato começaram a ser publicadas no início de junho pelo The Intercept e outros veículos. O caso ficou conhecido como Vaza Jato.
Sergio
Moro e Deltan Dallagnol tiveram o conteúdo de conversas atribuídas a
eles na série de reportagens. Os 2 contestam a autenticidade das
mensagens, mas não indicam os trechos que seriam verdadeiros e falsos.
Léo Pinheiro na pauta.
Poder 360
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