O discurso
independente e a desenvoltura do vice-presidente Hamilton Mourão (PRTB)
desgastaram a relação do Palácio do Planalto com o setor evangélico,
considerado fundamental na eleição do presidente Jair Bolsonaro. Nos
últimos dias, líderes de igrejas que durante a campanha apoiaram
explicitamente o candidato do PSL e representantes do segmento no
Congresso expuseram a insatisfação com o vice, principalmente após ele
se manifestar contra a transferência da embaixada brasileira em Israel
para Jerusalém.
As lideranças
religiosas e parlamentares da bancada evangélica pretendem pressionar o
presidente para que ele desautorize publicamente o vice – Bolsonaro
permanece internado em São Paulo se recuperando da cirurgia para a
reconstrução do trânsito intestinal.
Na condição de
presidente em exercício, Mourão recebeu no último dia 28 o embaixador da
Palestina no Brasil, Ibrahim Alzeben, e defendeu a posição que
contraria manifestações anteriores do próprio Bolsonaro.
Com 108
deputados e 10 senadores na atual Legislatura, a Frente Parlamentar
Evangélica, que tem uma atuação historicamente coesa em defesa de suas
bandeiras, terá um peso decisivo para a agenda do governo no Congresso
Nacional.
“Vamos cobrar
(do Bolsonaro) o cumprimento daquilo que foi tratado. Se o Mourão está a
serviço de algum grupo de interesse contrário a que isso aconteça,
tenho convicção que ele perdeu essa queda de braço. Mourão é um poeta
calado. Sempre que abre a boca cria um problema para o governo”, disse
ao Estado o deputado Sóstenes Cavalcante (DEM-RJ), principal porta-voz
da Frente.
O deputado deve
assumir a presidência do grupo nos próximos dias. O atual presidente,
deputado Hidekazu Takayama (PSC-PR), não se reelegeu.
Os evangélicos
ficaram também incomodados com o vice por causa de uma entrevista na
qual ele defendeu que o aborto é uma escolha da mulher. O ponto central
das queixas, contudo, é a questão da mudança da embaixada brasileira de
Tel-Aviv para Jerusalém. “Esse foi um compromisso de campanha do
presidente da República com nosso seguimento. Nós não pedimos muitas
coisas a ele, mas essa foi uma delas”, disse Sóstenes.
“Por que o
Mourão, sabendo das bandeiras do Bolsonaro, não se manifestou antes da
eleição? É uma coisa feia esconder suas convicções. Faltou protocolo e
ética no exercício da função dele. Mourão está fazendo campanha para
2022, mas a ala conservadora não vota nele nunca”, disse ao Estado o
pastor Silas Malafaia, líder da igreja evangélica Vitória em Cristo e
presidente do Conselho dos Pastores do Brasil.
O presidente
dos Estados Unidos, Donald Trump, reconheceu Jerusalém capital de Israel
em dezembro de 2017. Cinco meses depois, a embaixada norte-americana
foi transferida para lá.
Para o bispo e
presidente do Ministério Sara Nossa Terra, Robson Rodovalho, a mudança
da embaixada “facilitaria muito” a viagem de brasileiros a Israel e
estimularia a ampliação da oferta de voos.
Os contrários à
mudança alertam para os potenciais prejuízos para as exportações
brasileiras para países árabes, que estão entre os principais
importadores de carne bovina e de frango do País. O Brasil pode também
receber pressão da comunidade internacional. Para a ONU, o status de
Jerusalém deve ser decidido em negociações de paz.
“Quando o
Bolsonaro se recuperar, nós vamos marcar uma audiência com ele. A ideia é
levar uma carta deixando claro nossa insatisfação. Hoje, o Mourão é uma
instituição e deveria guardar as opiniões para ela”, disse o deputado
federal Filipe Barros (PSL-PR). Na semana passada, outros parlamentares
usaram a tribuna da Casa para criticar publicamente o vice.
Segundo fontes do primeiro escalão das
Forças Armadas ouvidas pelo Estado, Mourão age de forma “coerente” com o
pensamento dos militares, especialmente quando faz críticas à política
externa e sinaliza que a prioridade do governo deve ser a agenda
econômica, e não a de costumes.
Ao desautorizar
o chanceler Ernesto Araújo sobre a oferta de uma base no Brasil para os
EUA, Mourão reproduziu a linha de pensamento dominante nas Forças
Armadas, que contam com sete quadros no primeiro escalão e representam
um dos pilares da administração. Procurada, a assessoria do vice disse
que ele não iria se manifestar. As informações são do jornal O Estado de
S. Paulo.
Mourão na pauta.
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