O Supremo Tribunal Federal é uma coisa, um
botequim é outra coisa. Num ambiente, os conflitos são dissolvidos em
votações que resultam em sentenças. Noutro, as desavenças costumam
terminar em pancadaria. Pois nesta quarta-feira, graças ao ministro
Gilmar Mendes, a Suprema Corte viveu uma tarde típica dos piores botecos
da periferia.
Discutia-se uma ação direta de inconstitucionalidade sobre doações
ocultas de campanha. Ao votar, Gilmar alfinetou vários colegas,
criticando decisões e opiniões alheias ao processo que estava sendo
julgado. Cutucou Edson Fachin, Cármen Lúcia e Luiz Fux.
Tomado pela rispidez, Gilmar confrontou os colegas como se esgrimisse
contra eles uma garrafa de cerveja que acabara de quebrar na quina de
uma mesa de ferro metafórica do supremo boteco. Súbito, partiu para cima
de Luís Roberto Barroso.
Sem mencionar-lhe o nome, Gilmar citou o julgamento de um caso
relatado por Barroso na Primeira Turma do Supremo. Nele, ficou decidido
que interrupção de gravidez até o terceiro mês de gestação não é crime.
“Ah, agora vou dar uma de esperto e vou conseguir a decisão do aborto”,
ralhou Gilmar. “De preferência na turma com três ministros, aí fazemos
um dois a um.”
A escalada de ofensas de Gilmar chegou a tal ponto que o maior
excesso que os alvejados poderiam cometer contra ele seria o da
moderação. Não podendo mais tratar o colega com as mãos, Barroso
tratou-o como se o enxergasse no chão, na base do pontapé.
“Me deixa de fora do seu mau sentimento. Você é uma pessoa horrível.
Uma mistura do mau com atraso e pitadas de psicopatia”, disse Barroso,
transtornado. “Isso não tem nada a ver com o que está sendo julgado. É
um absurdo, Vossa Excelência aqui fazer um comício, cheio de ofensas,
grosserias. Vossa Excelência não consegue articular um argumento, fica
procurando, já ofendeu a presidente, já ofendeu o ministro Fux, agora
chegou a mim.”
Barroso prosseguiu: “A vida para Vossa Excelência é ofender as
pessoas. Não tem nenhuma ideia. Nenhuma. Nenhuma. Só ofende as pessoas. É
bílis, ódio, mau sentimento. É uma coisa horrível. Vossa Excelência nos
envergonha. Vossa Excelência é uma desonra para o tribunal, uma desonra
para todos nós. […] Vossa Excelência não tem ideia, não tem
patriotismo, está sempre atrás de algum interesse, que não é o da
Justiça, uma coisa horrorosa, uma vergonha.”
Cármen Lúcia viu-se compelida a suspender a sessão. Antes que o som
dos microfones fosse cortado, Gilmar fez um derradeiro disparo:
“Presidente, eu vou recomendar ao ministro Barroso que feche o seu
escritório. Feche o seu escritório de advocacia.”
Como se vê, respirou-se no Supremo uma atmosfera muito parecida com a
de um botequim de periferia. Com três diferenças: 1) Os contendores da
birosca não são remunerados com dinheiro público. 2) Na mesa de bar, as
brigas acabam na delegacia, no hospital ou no cemitério; 2) No boteco, o
tratamento é menos hipócrita.
A cada novo quebra-pau exibido pelas câmeras da TV Justiça a plateia
fica mais convencida de que certas palavras pederam completamente o
sentido. Na boca dos ministros do Supremo, “Vossa Excelência” nem sempre
é uma “excelência”. Não, não. Absolutamente. Muito ao contrário. No
Supremo, “Vossa Excelência” pode significar um biltre. Ou um psicopata.
Em nenhuma das hipóteses ”Vossa Excelência” merece receber remuneração
do contribuinte.
Gilmar Mendes é o saco de pancadas do STF.
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