Em artigo publicado na Folha de São
Paulo desta segunda-feira (27), o apresentador Luciano Huck declarou que
não disputará a Presidência da República:
Como Ulisses em “A Odisseia”, nos
últimos meses estive amarrado ao mastro, tentando escapar da sedução das
sereias, cantando a pulmões plenos e por todos os lados, inclusive
dentro de mim.
A tripulação, com seus ouvidos
devidamente tapados com cera, esforçando-se em não deixar que eu me
deixasse levar pelos sons dos chamados quase irresistíveis. São meus
amores incondicionais. Meus pais, minha mulher, meus filhos, meus
familiares e os amigos próximos que me querem bem.
Eles são unânimes: é fundamental o
movimento de sair da proteção e do conforto das selfies no Instagram
para somar forças na necessária renovação política brasileira. Mas daí a
postular a candidatura a presidente da República há uma distância maior
que os oceanos da jornada de Ulisses.
Há algum tempo me vejo diante desta
pergunta: qual foi exatamente a trajetória, o fato e até mesmo o momento
em que meu nome foi lançado entre os possíveis candidatos à Presidência
do Brasil?
Eu mesmo demorei um pouco para
encontrar a resposta. Mas depois de alguma reflexão, ela veio e me
pareceu muito clara: minha exposição pública e, espero, meu jeito,
minhas características, minha personalidade e a forma como vejo o mundo.
As mesmas forças que me movem desde sempre me levaram a esse lugar.
Explicando em outras palavras, entre
as centenas de defeitos que carrego, talvez eu tenha uma única virtude:
carrego desde sempre, genuinamente, enorme paixão e curiosidade pelo
outro.
Gosto muito de gente. Sempre gostei.
De todo tipo, origem, tamanho, cor, posição na pirâmide. É só olhar
para o que faço profissionalmente há mais de duas décadas. Não paro de
procurar pelo diferente. E não falo de um olhar distante, acadêmico,
teórico. Falo de andanças intermináveis por todos os quadrantes do
Brasil e por vários do mundo atrás daquilo que não conheço. Ando há anos
e anos por lugares ricos, paupérrimos, super ou subdesenvolvidos, em
guerra, centros moderníssimos de saber, cantos absolutamente esquecidos
pelo desenvolvimento. Sempre atrás da mesma coisa: gente boa.
E a sensação de “intimidade” que
meus mais de 20 anos de televisão provocam nas pessoas possibilita
conversas instantaneamente francas e verdadeiras.
Esse dia a dia me permitiu construir
uma visão muito própria e ampla dos recortes, curvas e reentrâncias do
país. Sinto na pele o pulso das ruas.
E foi essa permanente “bateção de
perna”, sempre ” in loco”, que me tirou definitivamente da zona de
conforto e me fez ver: O Brasil está sofrendo demais —especialmente os
mais pobres, mas não apenas eles— para ficarmos passivos e reféns deste
sistema político velho e corrupto. O que está aí jamais será empático,
perceberá e muito menos traduzirá as reais necessidades da gente. Da
nossa gente.
Vendo meu nome apontado, é muito
importante frisar sempre, sem ter levantado a mão ou me oferecido para
concorrer ao cargo mais importante na governança do país, minha reação
natural foi tentar entender melhor do que se tratava. Gosto de aprender,
de saber o que não sei e penso que cultivo um bom hábito desde muito
cedo: tentar descobrir e encontrar quem sabe.
De forma intuitiva e quase caseira,
fui procurando referências em pessoas que se dedicam de forma mais
intensa a entender o Brasil; o sofrimento, as dificuldades e,
principalmente, as soluções.
Acho também que sou meio obsessivo
por fazer as coisas direito. Por isso, saí buscando e principalmente
ouvindo dezenas de pessoas que admiro, que considero inteligentes,
sensíveis, maduras e capacitadas, para que elas compartilhassem comigo
suas visões. Foram meses que produziram em mim uma pequena revolução, um
aprendizado enorme.
Tantas ideias, tanta gente
interessada, brilhante e altamente capacitada, disposta a colocar
energia a favor de uma transformação definitiva: De um país à deriva em
uma nação de verdade, que possa de uma vez por todas refletir a
qualidade indiscutível do seu povo.
Aqui é importante pontuar uma
constatação que logo apontou no meu radar e que há tempos ecoa nele de
maneira incômoda. Minha geração está trabalhando e inovando com vigor em
muitas frentes. Há milhares de notáveis empreendedores, profissionais
liberais, atletas, executivos, artistas, intelectuais, pensadores e por
aí vai. Mas pela política, ela tem feito pouco.
Tenho dito sempre algo que me parece
muito evidente, quase óbvio, mas assim mesmo um alerta necessário: se
não nos aproximarmos de fato da política, se seguirmos negando esse
universo e refratários ao seu ambiente, ele definitivamente não se
reinventará por um passe de mágica.
Dito isso, sigo acreditando que o
melhor caminho passa obrigatoriamente pelos movimentos cívicos, pela
abertura de espaço na mídia para novas lideranças, por uma escuta dos
anseios das pessoas, por reformas estruturais, muitas delas doloridas,
por políticas públicas afetivas e efetivas, por políticas econômicas
modernas e eficazes, pela educação levada a sério, pela saúde tratada
com respeito, por tecnologia que alavanque as boas ideias e pela total
transparência dos gastos públicos. Por menos politicagem e por mais e
melhor representatividade. A lista é grande.
O momento de total frustração com a
classe política e com as opções que se apresentam no panorama sucessório
levou o meu nome a um lugar central na discussão sobre a cadeira mais
importante na condução do país.
É claro que isso me trouxe a
sensação boa de que uma parte razoável da população entende o que sou e
faço como algo positivo. Evidente também que junto vieram uma pressão
muito pesada e questionamentos de todos os tipos.
Já disse e escrevi antes, aqui neste
mesmo espaço, mas tenho hoje uma convicção ainda mais vívida e forte de
que serei muito mais útil e potente para ajudar meu país e o nosso povo
a se mover para um lugar mais digno, ocupando outras posições no front
nacional, não só fazendo aquilo que já faço mas ampliando meu raio de
ação ainda mais.
Com a mesma certeza de que neste
momento não vou pleitear espaço nesta eleição para a Presidência da
República, quero registrar que vou continuar, modesta e firmemente,
tentando contribuir de maneira ativa para melhorar o país. Vou bem além
da voz amplificada enormemente pela televisão que amo fazer, do eco
monumental das redes sociais que aprendi a tecer, do instituto que
fundei há quase 15 anos e de todos os meios que o carinho das pessoas me
proporcionou.
Vou também direcionar toda a energia de que disponho para outra coisa que acredito saber fazer: agregar.
Agregar as mentes sábias que fui
encontrando em diferentes camadas da sociedade, dentro e fora do Brasil,
pessoas extremamente capazes e dispostas de fato a conjugar o verbo
servir no tempo e no sentido corretos. Vou trabalhar efetivamente para
estruturar e me juntar a grupos que assumam a missão de ir fundo na
elaboração de um pensamento e principalmente de um projeto de país para o
Brasil.
E, para isso, não são necessários partidos, cargos, nem eleições.
Essa intenção já está viva através
dos movimentos cívicos dos quais me aproximei com bastante interesse e
intensidade. E de outras iniciativas que estão por vir.
Quero registrar de novo que entre as
percepções que confirmei nesses últimos meses está a convicção de que
não há nada mais importante do que tomarmos consciência da importância
da política e de que precisamos nos mover concretamente na direção da
atuação incisiva, para que não sejamos mais vítimas passivas e
manobráveis de gente desonesta, sem caráter, despreparada e incapaz de
entender o conceito básico da interdependência ou de pensar no coletivo.
A hora é de trabalhar por soluções
coletivas inteligentes e inovadoras para o país, e não de focar o
próprio umbigo ou de alimentar polêmicas pueris e gritas sem sentido.
Quem se interessa pelo que sou e
faço pode acreditar: vou atuar cada vez mais, sempre de acordo com
minhas crenças, em especial com a fé enorme que tenho neste país.
Contem comigo. Mas não como candidato a presidente.
Luciano Hulk.
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